O estudo sublinha que a participação de África no comércio agroalimentar mundial diminuiu consideravelmente nas últimas décadas, devido a várias falhas institucionais e estruturais.
África pode melhorar de forma significativa o seu posicionamento nas cadeias de valor agroalimentares globais, se conseguir reforçar o acesso do setor a capitais, formalizar os direitos fundiários, utilizar a política comercial para aumentar a transformação local e estabelecer políticas transfronteiriças centradas em investimentos em infraestruturas e logística. É o que revela um relatório publicado no sábado, 20 de novembro, por uma investigadora da Strathmore Business School de Nairobi, Lilac Nachum.
Intitulado “Agricultural exports from Africa are not doing well. Four ways to change that”, o documento publicado na revista The Conversation indica que o continente dispõe de uma importante proporção de terras aráveis não florestadas e pouco povoadas, bem como de condições climáticas que permitem cultivar 80% dos alimentos consumidos no mundo. Em teoria, estas condições deveriam favorecer um bom desempenho nas exportações, mas a participação africana nas exportações agroalimentares é a mais baixa do mundo. Ela recuou ao longo das últimas seis décadas, passando de cerca de 8% em 1960 para apenas 4% no início da década de 2020, segundo dados do Banco Mundial.
Com algumas exceções, como o Quénia e o Gana, os países africanos negligenciaram amplamente a exportação agroalimentar e escolheram a indústria transformadora como via de integração na economia mundial. Isto reflete-se claramente nas despesas públicas destinadas à agricultura, que representam em média 4% do total.
O relatório afirma que o continente poderia utilizar os seus recursos naturais para se tornar um importante exportador de produtos agroalimentares e impulsionar um crescimento económico generalizado, desde que sejam realizadas reformas em quatro áreas essenciais.
Melhorar o financiamento do setor
A primeira prioridade consiste em melhorar o acesso do setor agroalimentar ao financiamento. Embora contribua com 25 a 40% do PIB dos países africanos, a agricultura recebe apenas cerca de 1% dos empréstimos comerciais, segundo estimativas do Banco Mundial — devido, nomeadamente, aos riscos elevados, aos fracos horizontes de investimento a longo prazo, às garantias insuficientes e à vulnerabilidade dos lucros às flutuações dos preços. Além disso, as taxas de juro são frequentemente muito mais elevadas do que a média dos outros setores.
Os governos poderiam colmatar o défice de financiamento aumentando os empréstimos públicos, ao mesmo tempo que permitem a participação do setor privado através de mecanismos de partilha de riscos. O programa sul-africano de garantia de crédito Khula, uma parceria entre bancos comerciais e a agência governamental Small Enterprise Finance Agency (Sefa), ilustra como garantias apoiadas pelo Estado podem desbloquear financiamento para agricultores que não têm acesso a ele.
Este modelo foi reproduzido no Quénia e na Tanzânia com o apoio da União Europeia e de bancos de desenvolvimento. O capital de risco e as plataformas de microcrédito também podem ser mobilizados.
Formalizar os direitos fundiários
O segundo eixo de ação diz respeito à formalização dos direitos fundiários. Mais de 80% das terras aráveis africanas não estão registadas e são regidas por sistemas fundiários consuetudinários, mal integrados no direito formal. Esta situação limita a sua utilização como garantia e desencoraja o investimento. Além disso, as transferências de terras custam o dobro e demoram duas vezes mais do que nos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico). Isto limita o acesso ao crédito e as economias de escala necessárias para exportar.
Várias reformas fundiárias implementadas nos últimos anos demonstram as vantagens da formalização. Na Etiópia, a emissão de certificados de propriedade a 20 milhões de pequenos agricultores estimulou a atividade de arrendamento, enquanto a redistribuição de 15 000 hectares no Malawi aumentou os rendimentos dos agregados familiares beneficiários em 40%.
Investir na logística
Por outro lado, os governos africanos devem adotar políticas transfronteiriças específicas, focadas em investimentos em infraestruturas e logística, de modo a garantir a fluidez das exportações e a qualidade dos produtos. O Senegal, por exemplo, conseguiu aumentar as suas exportações anuais em 20% após investir no transporte marítimo rápido. Do mesmo modo, o crescimento da floricultura na Etiópia deve muito às suas cadeias de frio e ao transporte aéreo.
As políticas devem também ser adaptadas a cada fileira. A estratégia de exportação direcionada do abacate no Quénia, que estabelece normas rigorosas de qualidade e conformidade, fez do país o principal exportador africano, com um crescimento anual de dois dígitos. Já a política de exportação da manga no Mali, baseada em infraestruturas adequadas (centros de acondicionamento, câmaras frigoríficas, etc.) e em apoio técnico para cumprir as normas europeias, permitiu criar uma cadeia de valor competitiva que abastece os mercados do Velho Continente.
Políticas comerciais para estimular a produção e a transformação
O relatório indica ainda que os países africanos beneficiariam da utilização de instrumentos de política comercial — como impostos e restrições voluntárias à exportação — para incentivar a transformação local dos produtos agrícolas e, assim, aumentar o seu valor acrescentado. Os governos poderiam taxar ou restringir as exportações de produtos não transformados, de forma a promover a subida na cadeia de valor.
Ao mesmo tempo, é necessário investir nas capacidades de transformação, tanto mais que as experiências de vários países que já tentaram proibir a exportação de matérias-primas agrícolas — como o Botsuana, o Uganda e a Costa do Marfim — registaram um sucesso limitado devido à ausência de condições favoráveis.
Walid Kéfi













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