Cidade Velha, anteriormente conhecida como Ribeira Grande, ocupa um lugar singular na história de Cabo Verde e, de forma mais ampla, na história do Atlântico. Fundada em 1462 na ilha de Santiago, tornou-se o primeiro assentamento europeu duradouro nos trópicos. A sua criação marcou o início de uma presença portuguesa estruturada ao largo da costa africana e abriu uma nova fase da expansão marítima num momento em que as explorações ganhavam grande impulso.

No século XVI, a cidade transformou-se numa escala essencial para os navios que percorriam as rotas atlânticas. A sua posição estratégica — a meio caminho entre a África Ocidental, a Europa e as Américas — fez dela um ponto crucial de abastecimento, comércio e intercâmbio cultural. Esse papel favoreceu uma intensa atividade mercantil, incluindo o tráfico transatlântico de escravos, empreendimento trágico que marcou profundamente a região e contribuiu para o surgimento de sociedades crioulas em todo o Atlântico. Cidade Velha tornou-se, assim, um dos primeiros lugares onde mundos africanos e europeus se encontraram e se misturaram, originando formas culturais novas que ainda hoje influenciam a identidade cabo-verdiana.

A organização urbana, visível nos edifícios e nas ruas, reflete os modelos coloniais iniciais adotados pelos portugueses. Destacam-se estruturas militares como o Forte Real de São Filipe, construído no alto da cidade para protegê-la contra ataques de corsários. A urbe também abrigava edifícios religiosos importantes, como a igreja de Nossa Senhora do Rosário — uma das primeiras erguidas nos trópicos — e a catedral, da qual subsistem ruínas imponentes. O Pelourinho, coluna de pedra erguida na praça central, recorda o período em que a cidade funcionava como centro administrativo e judicial do arquipélago.

A partir do século XVII, ataques frequentes de piratas enfraqueceram a prosperidade de Ribeira Grande. As mudanças no comércio transatlântico, seguidas pela transferência da capital para a Praia em 1770, aceleraram o seu declínio. A antiga cidade perdeu gradualmente o seu estatuto, e muitos edifícios caíram em abandono. Contudo, esse lento esvaziamento acabou por preservar grande parte do tecido histórico, que não foi profundamente alterado pelo desenvolvimento posterior.

Na era contemporânea, esforços de conservação permitiram restaurar vários monumentos e garantir a proteção do sítio. Em 2009, o reconhecimento internacional concretizou-se com a inscrição do centro histórico de Cidade Velha na lista do Património Mundial da UNESCO. Essa distinção sublinha o valor universal de um lugar que oferece um testemunho raro dos primórdios da expansão europeia, das dinâmicas do comércio atlântico e dos processos de mestiçagem cultural.

Cidade Velha é mais do que um conjunto de vestígios. Continua a ser um arquivo vivo onde a história de Cabo Verde se inscreve na pedra, na paisagem e na memória coletiva. O seu património narra a experiência colonial, as mobilidades forçadas, os intercâmbios culturais e as transformações sociais que moldaram o Atlântico. Ao percorrer as suas ruas empedradas, ao observar as ruínas e as fortificações, ainda se percebem as marcas dos séculos que forjaram este lugar fundador, hoje um símbolo maior da identidade cabo-verdiana e da sua relação com o mundo.













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